Um livro, mesmo um livro mau, é mais difícil de fazer que um prédio moderno de dez andares, salvo seja a opinião de senhores mestres de obras, íamos a dizer dos senhores arquitectos, que se ocupam com tais frioleiras. Um livro, visto na sua medula espiritual, bem entendido, saiu todinho, como se diz nas trovas à viola, da cabeça do autor.
Saiu-lhe do cérebro, e nada de jacto como Ateneia da cabeça de Júpiter. Saiu-lhe por borbotões como nas dragas, borbotões de massa encefálica, sangue, suor, desespero, através de dias e dias. O homem de letras, sem recorrer a tabelas, nem socorro de nenhuma ordem, terá ele, sem mais ninguém, esboçado a traça geral, disposto em partes, procedido a enchimentos, apurado a alvenaria que são as palavras, coisa viva e fugaz como sardinha no mar. Ninguém o vê à banca, de suor a escorrer-lhe pela fronte. Mas é bem possível que gema, uive, se arrepele, dê punhadas na cabeça renitente.
Aquilino Ribeiro
In Dicionário Houaiss:
1 jacto forte e volumoso; caudal, jorro, borbulhão
Ex.: borbotões de petróleo
2 saída impetuosa de fluido gasoso; rajada, lufada, golfada
Ex.: b. de vento
1 incidente, acontecimento etc. sem importância; futilidade, ninharia, frivolidade
2 comportamento, gesto estúpido, insensato, tolo; parvoíce, patetice
que ou aquele que renite, que teima ou não se conforma; obstinado, pertinaz, inconformado
Labels: Aquilino Ribeiro
September 2006 October 2006 September 2007 October 2007 February 2008 March 2008